quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

DEPOIS QUE OTAR PARTIU

Vista parcial de Tbilissi, Capital da Georgia, onde foi rodado o filme Depois que Otar Partiu.


Tbilisi é uma multicultural cidade. A cidade é lar de mais de 100 grupos étnicos diferentes. Cerca de 80% da população é etnicamente georgiana, com importantes populações de outros grupos étnicos que incluem russos, arménios e azeris. Juntamente com os referidos grupos, Tbilisi é também a casa de vários outros grupos étnicos, incluindo ucranianos, gregos, judeus, estónios, alemães, curdos, assírios, e outros.

Tbilisi é a
capital e a maior cidade da República da Geórgia, situada nas margens do rio Kura. A demografia da cidade é diversificada e historicamente tem sido a casa de povos de diferentes culturas, religiões e etnias. Apesar de ser extremamente ortodoxa cristã, Tbilisi é um dos poucos lugares no mundo (Sarajevo e Paramaribo ser outra) onde uma sinagoga e uma mesquita estão localizados próximos uns aos outros.

Sempre tive vontade de fazer um passeio pelos bastidores de um filme, ver a preparação dos atores, a decupagem, as locações, o idioma, a cidade e o país escolhido, enfim, curiosidades de um cinéfilo. Acabei escolhendo um que de certa forma muito me chamou a atenção: DEPOIS QUE OTAR PARTIU, pelo fato de ser um título pra lá de sugestivo.

As perguntas que imediatamente surgem são: 1º Quem é Otar? 2º Partiu para onde? 3º Por que partiu?

Na verdade Otar nada mais é que um retrato na parede, uma lenda urbana, nem aparece na trama, apenas é citado através de suas cartas que chegam e são lidas. Desculpa esfarrapada para a história existir.

Então se prepare! Faremos uma viagem nesta história que boa parte dela acontece Tbilissi, capital da Geórgia (uma das ex-republicas da antiga URSS), depois vamos nos aventurar até Paris, capital das Luzes.

A trama é sobre segredos, mentiras e coisas mais de uma família de três mulheres e faixas etárias diferentes: Eka (honesta, patriota, altruísta e stalinista com orgulho, como ela mesma se denomina) mãe de Otar e Marina e avó de Ada; Ada, filha de Marina vivem nessa cidade pós-soviética onde faltam água, luz e outras precariedades.

Não costumo contar detalhes para não estragar a surpresa e o impacto de quem ainda vai assistir; apenas sugerir para que atente aos detalhes que aparentam insignificância. E este é recheado deles.

Otar é um médico desempregado que resolve tentar a sorte em outro país, e sua escolha não podia ser melhor que Paris, deixando para trás sua família. Ele passa sete meses se correspondendo com ela através de cartas, enviando juntamente algum dinheiro. Outras vezes, mantém contato por telefone.
Segundo o que conta nas cartas, a vida em Paris, a princípio, não é nada fácil, trabalhando ilegalmente na construção civil, sem contrato, sem nenhum direito.

Ada, a neta é que faz a leitura das cartas de Otar para a avó e posteriormente as responde. O ciúme entre os irmãos Otar e Marina é evidente; Eka não escondia sua preferência pelo filho querido que agora estava distante.

De repente, as cartas param de chegar. Marina fica sabendo por um amigo do irmão que ele morreu num acidente de trabalho e foi enterrado como indigente. Parece que caíra de um andaime. Sem saber o que fazer, Marina conta com a ajuda da filha e decidem não contar o fato à Eka para não entristecê-la e fazê-la sofrer. E ambas acham uma solução insólita e mágica: resolvem que elas escreveriam as cartas se passando pelo falecido Otar. E a mentira perdura por tanto tempo que Eka resolve vender a biblioteca de sua casa para comprar as passagens das três até Paris e visitar o filho.

Em Paris, enquanto Marina e Ada vão ao cemitério, Eka vai ao endereço de Otar, e lá descobre por um dos vizinhos que ele falecera já há alguns meses. Parece que no íntimo ela já sabia por não expressar nenhuma reação. Agora o segredo é de Eka e ao encontrar a sua filha e neta conta-lhes uma mentira, dizendo que Otar foi para a América do Norte que era o seu sonho. O instigante jogo de mentiras nesta história não pára por aí.

*****
Niko, Vai até a casa de Eka entregar uma mala com os pertences de Otar.
Especula-se a morte de Otar. Niko, um dos amigos dele conta que não havia segurança e nenhuma proteção aos trabalhadores. A empresa, para não se responsabilizar diz que Otar andava depressivo e que ele se suicidara. Mas isso já é outra história.

E os bastidores um mundo de encanto e magia à parte tanto quanto ao filme pronto.

*** **
Depois que Otar partiu tem produção e direção francesa. Dirigido por Julie Bertucelli. A maior parte da história se passa em Tbilissi. Dos três idiomas - francês, russo e georgiano - a diretora optou pelo último já que é o idioma oficial falado na Geórgia, onde o filme foi rotado, a outra locação foi Paris. A cultura, o folclore é freqüentemente mostrado em close up, como por exemplo, a ÁRVORE DOS DESEJOS, localizada numa estrada movimentada, onde pessoas param amarram um lenço nos galhos e fazem seus pedidos; a leitura de borra de café deixado na xícara por Ada, a neta; um passeio pelo campo e colheita de frutas silvestres por Eka, a avó; na casa, a preciosa e imponente biblioteca de causar inveja, e o quarto de Otar com todos os seus objetos e coisas pessoais, minuciosamente escolhidos e ali plantados.
A sensualidade na cena do namoro de Ada dentro do carro a plena luz do dia não passa despercebida.

Muita água rola, antes de se ouvir a frase “VAMOS RODAR!” É gratificante e emocionante saber como é a realização e a preparação do filme, que trabalheira que dá. A escolha das locações, dos objetos e todos os seus acessórios. Os mínimos detalhes na casa onde a família viverá, desde o abajur comprado na vizinhança até o varal improvisado, e todos outros detalhes de jardim e pequena horta na entrada; na sala não se deve esquecer da vela derretida no castiçal (pelo calor que faz na Geórgia), uma foto de Paris na parede (lembrança de Otar), o detalhe da marca registrada do envelope florido russo das cartas respondidas pela mãe, o retoque constante no roteiro, cenas de três segundos que duram uma eternidade para se rodar...

O nome OTAR é homenagem a Otar Losseliani diretor Georgiano de Adeus, Doce Lar e
Bandoleiros, Capítulo 7. Migrou para a França devido à censura; seus filmes foram proibidos repetidamente na URSS.
Em Tbilissi há um famoso Mercado de Pulgas onde engenheiros, professores etc vendem seus próprios objetos; a equipe de filmagens esteve lá e comprara muita coisa.

Há uma cena maravilhosa gravada num parque charmoso de Tbilissi, fizeram muitas fotos, para se filmar quatro ou cinco cenas com Eka fumando numa roda-gigante.

Pais - FRANÇA
Ano: 2003
Direção: JULIE BERTUCCELLI
Elenco: ESTHER GORINTIN, NINO KHOMSSOURIDZE
Genero: Drama

2 comentários:

Roberto Souza disse...

Isso de camuflar uma realidade e, aos poucos, forjar evidências que lhe confiram veracidade, remete a outro filme sobre os estertores da Cortina de Ferro: ADEUS LÊNIN (2003), de Wolfgang Becker. Neste, os dois filhos de uma convicta comunista alemã tudo fazem para ela continuar acreditando que o velho regime perdura, após despertar de um longo processo de coma, durante o qual caíra o Muro de Berlim.

Acho interessante quando se trabalha a ilusão dentre da mais ilusória das artes, o cinema. Configura-se quase um exercício de metalinguagem, uma estilização levada ao extremo. Todo o processo cinematográfico assemelha-se a um mosaico, uma colcha de retalhos onde a costura muitas vezes é casual, pois novos remendos podem ser incorporados. Visto de dentro torna-se verdadeiramente fascinante, embora incompreesível. As partes não parecem compor um todo. As proporções não seguem uma lógica, o tempo dilata-se misteriosamente para capturar em filme poucos segundos que serão vistos na tela.

A câmera torna-se varinha de condão, caldeirão de bruxa ou cartola de mágico. O mecanismo que nos exibirá o prodígio mas guardará a fórmula. Porque ao termos projetado o feitiço, visto pelo espectador de certa distância, o mosaico esconderá suas falhas, as imagens ocultarão seus truques e tudo confirmará a mais sedutora das realidades, seja de Tbilisi a Paris ou de Berlim ao Rio de Janeiro.

E Bernal disse...

Disse tudo, Roberto.